Resumo: Artigo 36160
Software livre, espectro aberto e cooperativismo: articulando possibilidades democráticas em uma comunidade da periferia carioca (10, 11, 12, 61, 108, 111)
Luiz Arthur Faria, Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, BrazilHenrique Cukierman, COPPE/Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brazil.
Apresentação: Friday, May 30, 2008 1:15PM - 3:15PM sala 212 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 37 - Chair: Sergio Amadeu
Abstract.
O artigo pretende investigar as articulações entre software livre, espectro aberto e cooperativismo na comunidade carioca do Morro dos Macacos. Ela deve estar comemorando mas desta vez não é nem o fim de um tiroteio nem o início dos ensaios da Vila Isabel, a escola de samba do asfalto vizinho. O motivo é o T@I.Com - Todos Acessando a Internet na Comunidade, projeto elaborado pela Dinamicoop, uma cooperativa de TI local. O projeto prevê a criação de uma rede de comunicação sem fio na comunidade, inicialmente provendo acesso à internet a uma creche pública, a uma associação de moradores, a uma escola de samba mirim e a um centro comunitário. Com raio de 5km, a rede heterogênea que compõe o empreendimento terá ainda servidores, acessos via Wi-Fi, computadores reciclados sem disco rígido, softwares livres, universidade (PUC-Rio), ONG (Movimentos em Rede) e empresas (IBM, Cisco e WiNGS Telecom). Vila Isabel é um bairro tradicionalmente conhecido por sua boemia e suas grandes contribuições a uma das mais importantes expressões culturais brasileiras: o samba. Para o antropólogo Hermano Vianna, os mistérios da ascensão social e nacionalização do samba somente são desvendados considerando que o samba cresce, se (re)forma e se renova exatamente nas conexões entre grupos diferentes, nos interstícios, em um processo descentralizado. A proposta de Vianna permite pensar a investigação proposta no presente artigo a partir da metáfora do rizoma, nos termos propostos, por Gilles Deluze e Félix Guatarri (1980). Por outro lado,o Morro dos Macacos não respira somente samba e boemia. Outras metáforas, práticas, linguagens e tecnologias estão presentes um outro discurso, segundo Paul Edwards, autor de The Closed World: Computers and the Politics of Discourse in Cold War America (1996). Em muitas das favelas cariocas como a do Morro dos Macacos, o cotidiano inclui as facções do tráfico de drogas, geridas com rígida hierarquia e caracterizadas pela contenção (da facção rival em limites geográficos) e pela centralização (do comando no interior de uma facção). As semelhanças deste discurso, em que vive grande parte da periferia urbana brasileira, com outra realidade de guerra examinada por Edwards - a da Guerra Fria -, pintam um quadro angustiante : favelas como mundos fechados, onde a democracia não entra. É neste ambiente que a rede do T@I.Com cresce. Em sua construção sociotécnica, encontramos exemplos do que Bruno Latour chama de alistamento de aliados e de traduções: aquilo que para a ONG Movimentos em Rede seria uma ferramenta para aprimorar a conexão entre projetos sociais e movimentos comunitários (o software livre Plurall), para um pesquisador da PUC-Rio traduziu-se em uma forma de materializar uma inclusão digital diferente. Esta inclusão é contextualizada na emergência das chamadas cidades digitais, onde as redes de transmissão sem fio utilizam-se de bandas não-licenciadas (áreas livres), o chamado espectro aberto. Ao subir o Morro dos Macacos, o Plurall sem fio encontra-se com a Dinamicoop - segundo um integrante da ONG Movimentos em Rede, uma cooperativa autêntica -, conformando-se assim o T@I.Com. Em meio a esta rede, mas não somente nela, cresce um discurso que pode ser denominado, à falta de uma palavra mais apropriada em português, de discurso do commons (a utilização corrente da palavra deriva da militância norte-americana em prol do software livre). Um discurso que cresce de forma rizomática: sua (re)construção é permanente, se dá nas conexões entre diferentes grupos e movimentos (como os da economia solidária, do software livre e do espectro aberto), nos interstícios de outras ordens e através de um processo descentralizado. Um discurso que, ao apontar para liberdade, colaboração, compartilhamento e descentralização, distancia-se de idéias como contenção, confidencialidade, centralização, e organizações hierarquizadas,. Um discurso que, através de uma cultura de coletividade e participação, é potencialmente útil para o avanço de uma cultura tecnocientífica e democrática nas periferias urbanas brasileiras. Referências DELEUZE, Gilles; GUATARRI, Felix, 1995 [1980]. Mil Platôs Capitalismo e Esquizofrenia. Trad. de Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa, Rio de janeiro: Editora 34. EDWARDS, Paul N., 1996. The Closed World : Computers and the Politics of Discourse in Cold War America. Massachussetts: MIT Press.